Demagogia

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Demagogia é um termo de origem grega que significa "arte ou poder de conduzir o povo". É uma forma de atuação política na qual existe um claro interesse em manipular ou agradar a massa popular, incluindo promessas que muito provavelmente não serão realizadas, visando apenas a conquista do poder político[1] ou outras vantagens correlacionadas.

É a estratégia de condução político-ideológica, valendo-se da utilização de argumentos apelativos, emocionais ou irracionais, em vez de argumentos racionais[2] para proveito próprio.

Em geral, a demagogia está relacionada à negativa da deliberação racional, fazendo uso de uma das falhas da democracia, qual seja, manipular a maioria pelo uso de aparentes argumentos de senso comum entremeados com disjunções falaciosas, prática esta que remonta já à Grécia antiga, muito embora sem conotação negativa a princípio.[3]

História[editar | editar código-fonte]

Origina-se do termo grego δημαγωγία (/ˈdeməˌgäjē, -ˌgōjē/), que, por sua vez, compõe-se de dēmos (povo, população) + agōgos (liderar, liderança), que, na Grécia e Roma antigas referiam-se ao orador que falava em nome da população menos afortunada.[4]

De fato, os demagogos gregos defendiam as classes mais pobres, em geral fazendo uso de violência e outros artifícios apelativos, sem restrições de ordem comum, alegando o benefício de suas próprias ações na defesa de direitos da maioria, justificando-se como tal uma oposição à aristocracia conjuntural.[5]

No livro "A Política", Aristóteles aponta a demagogia como a corrupção da democracia assim como a tirania correspondia à corrupção da monarquia[6] .

Posteriormente, na Idade Média e Renascentismo, o conceito vai adquirindo outras conotações, à medida que o Estado vai sendo consolidado, não raro fazendo uso dessas estratégias como forma de manipulação de massas. Maquiavel discute que o Estado é a única organização cuja ação mobiliza todos, visto que dispõe de todos os meios e bens materiais de gestão e coação. O Estado é um meio de cooptação e coerção que age sobre a sociedade e os indivíduos. Desta forma, instrumentalizar-se-ia o ato de manipulação de massas que serviriam a um propósito.[7]

O ateniense Cleon ficou conhecido como notório demagogo por causa de três eventos descritos por Aristófanes e Tucídides.[8] [9]

Primeiramente, após a fracassada revolta em Mitilene, Cleon persuadiu os atenienses para realizar o abate de todos os homens da cidade, não apenas dos prisioneiros, assim como a realizar a venda das esposas e filhos como escravos. No dia seguinte, porém, os atenienses revogaram esse ato. Em segundo lugar, depois de Atenas ter derrotado completamente a frota do Peloponeso, Esparta apenas poderia pedir a paz em quaisquer termos que fossem. Cleon, porém, persuadiu os atenienses a rejeitar a oferta de paz. Em terceiro, Cleon lançou provocações aos generais atenienses, chamando-os de covardes e alegando poder levar a efeito a guerra contra a Esfactéria mesmo sem conhecimento militar.[10] [11]

Alcibíades é outro exemplo de demagogo. Ele convenceu o povo de Atenas para tentar conquistar a Sicília durante a Guerra do Peloponeso, com resultados desastrosos. Liderou a assembléia ateniense, utilizando-se de artifícios que lhe permitiram tornar-se comandante.[12]

Nos tempos atuais, refere-se à demagogia de determinadas correntes políticas, [13] quase sempre como ofensiva de caráter pessoal. Porém, se bem seja possível caracterizar o populismo direitista ou até mesmo o esquerdismo como correntes de cunho demagógico, esta é uma prática que está afeita ao ato político atual, sendo, praticamente, inerente ao ato político ocidental.[14] [15] [16]

Alguns autores de ciências políticas chegam a citar novos conceitos, como demagogia digital, indo além do puro significado conotativo do termo. PONS refere também que é importante não confundir o conceito de retórica, falácia e demagogia.[17]

Visão aristotélica[editar | editar código-fonte]

Para Aristóteles, o que hoje denominamos demagogia, ele chamava democracia, pois tinha para si a profunda corrupção do governo popular no tempo que escreveu. E o que denominamos democracia, ele designava como politia. À monarquia denominava realeza e à tirania, chamava despotia.[18]

Ele aponta que a demagogia seria para a democracia o que a tirania seria para a monarquia, explicando como possível dismorfia do ato altruísta da política para uma posição centrada em interesses pessoais ou grupais de forma isolada e não em conjunto, fazendo uso da lisonja e da oratória torcida e falaciosa. Porém, mesmo neste contexto, não se aponta como necessariamente negativa ou enganosa.[19]

De fato, é comum na população em geral, discutir-se esse tipo de temática com o uso de conceitos de senso comum, mas, no contexto da obra de Aristóteles, que inspirou toda a produção posterior, a política seria "intimamente unida à moral, sendo fim último do Estado a virtude, isto é, a formação moral dos cidadãos e o conjunto dos meios necessários para isso". O Estado seria, portanto, "um organismo moral, condição e complemento da atividade moral individual e fundamento primeiro da suprema atividade contemplativa". A Política, contudo, seria "distinta da Moral, porquanto esta teria como objetivo o indivíduo, aquela a coletividade. A ética é a doutrina de moral individual, a política é a doutrina da moral social. Desta ciência trata Aristóteles precisamente na Política. O estado, então, é superior ao indivíduo, porquanto a coletividade é superior ao indivíduo, o bem comum superior ao bem particular. Unicamente no estado efetua-se a satisfação de todas as necessidades, pois o homem, sendo naturalmente animal social, político, não pode realizar a sua perfeição sem a sociedade do estado."

Quanto à forma exterior do estado, Aristóteles distingue três principais:

  • a monarquia, que é o governo de um só, cujo caráter e valor estão na unidade, e cuja degeneração é a tirania;
  • a aristocracia, que é o governo de poucos, cujo caráter e valor estão na qualidade, e cuja degeneração é a oligarquia;
  • a democracia, que é o governo de muitos, cujo caráter e valor estão na liberdade, e cuja degeneração é a demagogia.

As preferências de Aristóteles vão para uma forma de república democrático-intelectual, a forma de governo clássica da Grécia, particularmente de Atenas.[20]

Referências

  1. Significado de Demagogia, Significados.com.br
  2. Oxford Dictionaires. Demagogue. Visitado em 22 de janeiro de 2014.
  3. OSTWALD, Martin.. From Popular Sovereignty to the Sovereignty of Law.. San Francisco: University of California Press, 1986. p. 201. ISBN 0520067983
  4. Oxford Dictionaires. Demagogue. Visitado em 22 de janeiro de 2014.
  5. SIGNER, M.. "Defining the Demagogue". Demagogue: The Fight to Save Democracy from Its Worst Enemies.. [S.l.]: Macmillan, 2009. p. 32-38. ISBN 0230606245
  6. Significado de Demagogia, Significados.com.br
  7. MAQUIAVEL, N.. "O Príncipe": Com comentários de Napoleão Bonaparte. 7ª ed. [S.l.]: Elsevier Editora Ltd., 2003. p. 33-92. ISBN 8535213023
  8. GRANT, M.. Ancient Historians. [S.l.]: Barnes & Noble Publishing, 1994. 110-111 p. p. 98. ISBN 1-56619-599-3
  9. ARISTOPHANES. The knights. [S.l.]: Sparklesoup LLC, 1902. p. 5-6. ISBN 1597486973
  10. GRANT, M.. Ancient Historians. [S.l.]: Barnes & Noble Publishing, 1994. 110-111 p. p. 98. ISBN 1-56619-599-3
  11. ARISTOPHANES. The knights. [S.l.]: Sparklesoup LLC, 1902. p. 5-6. ISBN 1597486973
  12. VERDEGEM. Plutarch's Life of Alcibiades: Story, Text and Moralism. Plutarchea Hypomnemata Series.. [S.l.]: Leuven University Press, 2010. 220-290 p. ISBN 9058677605
  13. Michael Grant, Ancient Historians, p. 98, pp. 110–111. Barnes & Noble Publishing (1994). ISBN 1-56619-599-3
  14. BARRET. Plutarch's Life of Alcibiades: Story, Text and Moralism. Plutarchea Hypomnemata Series.. [S.l.]: SUNY Press, 1991. 107-108 p. ISBN 0791404838
  15. FARHAT. Dicionário Parlamentar e Político:O processo político e legislativo no Brasil.. [S.l.]: Fundação Petrópolis - Companhia Melhoramentos, 1996. p. 238. ISBN 8506022959
  16. BORON et al. Teoria e Filosofia Política: A Recuperação dos Clássicos no Debate Latino-Americano. [S.l.]: EdUSP, 2004. 150-178 p. ISBN 853140813X
  17. PONS, M.. Teoria Politica - Nuova Serie - Annali III Bovero Ed.. Visitado em 23 de janeiro de 2014.
  18. AZAMBUJA. Introdução à Ciência Política. [S.l.]: Globo Livros, 1973. p. 234. ISBN 8525045748
  19. ARISTÓTELES. "A Política". [S.l.]: Hemus, 2008. p. 12-72. ISBN 8528905659
  20. PUC. Aristóteles - Política Tese de Pós-Graduação/Não publicada. Visitado em 22 de janeiro de 2014.

Ver também[editar | editar código-fonte]

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