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Bolivianos são o grupo mais atingido pela tuberculose em São Paulo

 

Matéria de Pedro Z. Malavolta, da Agência Brasil, 24/3/2005

A incidência de tuberculose na cidade de São Paulo está acima da média brasileira: quase 63 casos para cada cem mil habitantes na capital paulista contra 48,4 para cada cem mil no Brasil. A concentração, porém, é ainda maior entre os imigrantes bolivianos.

São muitas as estimativas sobre a população total desses imigrantes na capital. O consulado tem 15 mil cadastrados, mas estima que existam mais, por volta de 60 mil. A pastoral do Imigrante Latino-americano estima entre 60 e 80 mil, mais de 40% ilegais. Segundo o padre responsável pela pastoral, Roque Patussi, algumas pessoas calculam que existam mais de 200 mil bolivianos só na capital paulista.

Em entrevista á Agência Brasil, Patussi informou que no ano passado a pastoral ajudou mais de 5 mil imigrantes de vários países a legalizar sua situação. Desses, 86% eram bolivianos. "Se você considerar que cada um regulariza não apenas a sua situação, mas a de sua mulher e de um filho que seja, já são mais de 13 mil", comenta.

A experiência da Unidade Básica de Saúde (UBS) do Brás, bairro do centro de São Paulo, no qual reside e trabalha a maioria dos bolivianos, mostra como a incidência é mais alta entre os esses imigrantes. Segundo Vagner Urias, coordenador do Programa da Saúde da Família (PSF) na unidade, ligado ao Ministério da Saúde, os bolivianos já chegaram a ser 58% dos pacientes em tratamento de tuberculose. Dos cem pacientes da UBS atendidos desde fevereiro de 2001, quando começou o programa de tratamento supervisionado de tuberculose, mais da metade foi de bolivianos.

Para conseguir atender melhor os imigrantes bolivianos e de outros países latino-americanos que moram na região, todos os funcionários da UBS do Brás receberam aulas de espanhol e de cultura dos países vizinhos. Segundo Urias, pela prioridade que dá ao programa, a unidade conseguiu uma taxa de cura de 94% dos casos tratados, maior do que a meta estabelecida pelo ministério, de 80%.

O secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, Jarbas Barbosa, afirma que o Sistema Único de Saúde brasileiro não discrimina ninguém. "Qualquer pessoa que procura o posto vai receber o diagnóstico e o tratamento sem nenhuma averiguação sobre sua condição legal". Hoje todos os imigrantes, legalizados ou não, recebem o mesmo tratamento oferecido aos brasileiros. No caso da tuberculose, o governo garante transporte entre a residência e o local onde, todos os dias, o paciente recebe café da manhã e toma o remédio, na presença de um enfermeiro ou médico. O governo também fornece uma cesta básica durante os seis meses de tratamento.

 

Programa Saúde da Família atende imigrantes


Os imigrantes contaminados por tuberculose que vivem em São Paulo são atendidos pelo Programa Saúde da Família, uma parceria do Ministério da Saúde com secretarias estaduais e municipais de Saúde. Segundo o padre Roque Patussi, coordenador da Pastoral do Imigrante, no ano passado a pastoral promoveu, junto com a Unidade Básica de Saúde (UBS) do Brás, uma campanha de esclarecimento para os imigrantes latino-americanos, que distribuiu 20 mil panfletos em espanhol.

Para o coordenador do Programa Saúde da Família (PSF) da unidade do Brás, o enfermeiro Vagner Urias, as condições ruins dos locais de trabalho e moradia dos imigrantes latino-americanos contribui para contraírem a doença. Boa parte desses imigrantes vive em condições degradantes de trabalho, come e dorme nas oficinas de costura nas quais trabalha, na região central da cidade de São Paulo. "As condições precárias fazem com que a imunidade deles baixe, e os locais pequenos e fechados contribuem para a contaminação", explica. Urias informa também que, além da tuberculose, os imigrantes latino-americanos são muitos afetados por todas as doenças respiratórias.

Nos últimos dois anos, os funcionários da unidade do Brás receberam aulas de cultura latino-americana e língua espanhola, para poder atender os muitos moradores da região. Os agentes comunitários de saúde que fazem visitas às casas da região, como parte do Programa Saúde da Família, também receberam treinamento específico sobre tuberculose e, sempre que conseguem, entram nas confecções. Eles dão informações aos trabalhadores sobre as doenças mais comuns e tentam coletar amostras de secreção para testes de tuberculose em laboratório. Os imigrantes contaminados recebem o mesmo atendimento prestado aos brasileiros, estejam ou não legalmente no país.

 

Falta de vacina prejudica, explica Pastoral do Migrante

 

A alta incidência de tuberculose entre os bolivianos ocorre porque eles não receberem nenhum tipo de imunização. Segundo o padre Roque Patussi, coordenador da Pastoral do Imigrante, uma das razões é a falta de acesso a vacinas na Bolívia, principalmente a BCG, que previne a doença. "Além de ter de pagar pela vacina, os bolivianos têm dificuldades de acesso a ela. A maioria dos imigrantes mora no interior ou nas favelas das grandes cidades, e não tem acesso a serviços de saúde", explica.

Patussi conta que a incidência de tuberculose é menor entre imigrantes de outros países latino-americanos que vêm para São Paulo trabalhar nas confecções, como os bolivianos. Ele não se lembra de casos de imigrantes chilenos, apenas de alguns casos de paraguaios. "Já os peruanos, quando contraem tuberculose, é sempre de um tipo mais forte e resistente". A pastoral estima que vivam na capital paulista entre 60 mil e 80 mil bolivianos, 40 mil paraguaios, de 15 mil a 20 mil chilenos e de 14 mil a 16 mil peruanos.

 

Casal recebe tratamento para tuberculose no SUS


Rubens Santos Aguilar Lima e Maria Candy Apaza Toledo têm 25 anos e são bolivianos da capital, La Paz. Deixaram seus dois filhos com a mãe de Maria e vieram para o Brasil em busca de emprego em uma das muitas confecções do Brás e da Barra Funda, no centro de São Paulo. Aqui contraíram tuberculose e, depois de uma experiência ruim com um médico brasileiro, conseguiram tratamento.

Maria afirma que eles, como outros bolivianos, vieram para o Brasil "atrás de um sonho". "Minha filha sempre quis uma bicicleta e minha mãe também precisa de ajuda", revela. A Bolívia é o país mais pobre da América do Sul e é de lá que vem o maior número de imigrantes que vivem na capital paulista. As estimativas variam de 15 mil a 80 mil pessoas. A comunidade é uma das mais afetadas pela tuberculose na cidade.

Rubens e Maria chegaram ao Brasil desacompanhados e conseguiram emprego perguntando a parentes e compatriotas. No entanto, a maioria dos bolivianos, assim como de peruanos, chilenos e paraguaios, chega ao Brasil sob recrutamento de "coiotes", e vai direto para a empresa de confecção de roupas que os "encomendou".

O casal de bolivianos, como outros imigrantes latino-americanos, trabalhava mais de 16 horas por dia, de segunda a sábado, dormindo e se alimentando no local de trabalho. Ambos recebiam por peça costurada menos de R$ 0,50, depois de descontada a alimentação, moradia, aluguel das máquinas e até os telefonemas. Ficaram nessa oficina durante seis meses, até que Rubens adoeceu. Ele tem certeza de que foi a dona da oficina, também boliviana, que lhe passou tuberculose. "Ela ficava sempre tossindo. Eu até dizia: ‘vá a um hospital, a senhora deve estar doente’, mas ela não escutava", relembra.

Pouco antes de sair da primeira oficina, Rubens foi a um posto de saúde pública. Ele estava com uma tuberculose ganglionar, mais rara do que a pulmonar. Por isso, tinha os gânglios inchados na região do pescoço e a pele escoriada. O médico fez uma biopsia descobriu que se tratava de tuberculose, mas indicou apenas que ele comprasse um antiinflamatório.

Rubens e Maria foram para outra confecção, mas ele não conseguia trabalhar por causa da doença e foi demitido. No último dia em que ficaram nesta oficina, Rubens conta que exigiu de seu patrão o pagamento das poucas peças de roupa que ele havia costurado, mas foi agredido pelo patrão e posto para fora.

Depois de rodar pela cidade, Maria encontrou a Casa do Migrante, um albergue mantido pela pastoral do Imigrante da Igreja Católica. Da casa, foram encaminhados para a Unidade Básica de Saúde do Brás, que há dois anos treina seus funcionários para atender os imigrantes latino-americanos que moram na região. Ali também foi diagnosticada a tuberculose em Maria.

Eles tiveram o mesmo tratamento dispensado aos brasileiros: recebem o transporte até o posto de saúde onde tomam café da manhã e os remédios, na presença de um profissional de saúde. Rubens e Maria só não pegam a cesta básica porque recebem alimentação da Casa do Migrante. Eles querem terminar logo o tratamento para poder voltar a trabalhar. "Mas não trabalho nunca mais com costura", afirma Maria.

 

Fonte: Agência Brasil

 

Título original: Imigrantes bolivianos são o grupo mais atingido pela tuberculose na cidade de São Paulo.

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