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Início Entrevistas Entrevistas “Não podemos asfaltar uma estrada só porque está classificada”

“Não podemos asfaltar uma estrada só porque está classificada”

Palavras de Francisco Pereira O presidente do Conselho de Administração do Fundo de Estradas admite que continua a haver várias falhas na rede rodoviária do país, mas explica que o processo tem de ser faseado e que nem todas as estradas têm de ser asfaltadas

As previsões indicam que o projecto de reabilitação da Estrada Nacional número 1 (EN1), que liga todo o país partindo da cidade de Maputo até à cidade de Pemba, em Cabo Delgado, terminará em 2012. Há condições para termos a EN1 transitável nessa data?

Quando falamos da EN1, referimo-nos a milhares de quilómetros. Há partes da estrada que já foram concluídas até aos finais de 2008, com vários troços que co­meçaram antes deste mandato e que estão a ser concluídos. O que falta é, fundamen­talmente, a sul do Save, e compreende três troços todos já iniciados, nomeadamente, Massinga-Nhachengue, na província de Inhambane, Xai-Xai-Chissibuca, provín­cia de Gaza, e Jardim-Benfica, em Mapu­to, este último na fase inicial. Estes tro­ços precisam de ser alargados, porque há muito tráfego, e a ideia é fazer duas faixas. Ainda temos dois troços por completar na província da Zambézia, entre Nampevo e Alto Molócuè. São dois lotes, que não foram concluídos porque o empreiteiro teve alguns problemas, mas o troço até Alto Molócuè estará pronto até ao fim deste ano. O outro, Nampevo-Mocuba, passa para o próximo ano. Na província de Nampula e início da província de Cabo Delgado, também temos dois lotes cujas obras ainda não começaram, e que têm financiamento americano. Em 2012, es­peramos ter a estrada Maputo-Pemba em boas condições.

Temos algumas garantias em termos de financiamento?

Todos os financiamentos estão completa­mente garantidos, senão nem falávamos no assunto. Estas são acções concretas que já constavam do programa passado e que es­tão no programa quinquenal deste ano.

Falou do troço Jardim-Benfica, um troço que faz parte do programa e que já devia ter arrancado em Julho. O que está por detrás do atraso verificado?

Foi necessário fazer o reassentamento da população, de lojas, e esse é sempre um pro­cesso complicado, porque está sujeito a uma negociação que nem sempre está dentro do nosso controlo. As pessoas, muitas vezes, querem mais do que é possível e razoável dar. Por outro lado, no troço Jardim-Benfica há um condicionamento do tráfego, porque é uma estrada com muito movimento, che­gando a ter cerca de 15 mil carros a passa­rem diariamente. E temos de tomar todos os cuidados para que os automobilistas não fi­quem castigados com as obras, mas possam usar uma série de vias alternativas.

Concretamente, quando começam?

Já começaram, as pequenas acções já come­çaram.

Temos cerca de 30 mil quilómetros de es­tradas classificadas em todo o país, mas apenas cerca de 7 mil quilómetros estão asfaltados. Existe um plano concreto de asfaltagem de estradas?

Temos de fazer isso dentro de um prazo que seja possível. O plano com que trabalha­mos vai até 2014, sendo que algumas dessas obras já estão financiadas. Não podemos fa­zer tudo rapidamente porque, hoje, o custo de asfaltagem de um quilómetro de estrada é muito alto, situando-se na ordem dos 700 mil a 1 milhão de dólares. Ou seja, para fa­zermos 20 mil quilómetros de estrada, pre­cisamos de 20 mil milhões. É uma quantia muito grande que o país não tem de ime­diato. Mesmo que tivéssemos o dinheiro, ou pedíssemos um empréstimo, não teríamos capacidade de recursos humanos, teríamos de contratar empreiteiros de fora. Este é um processo crescente, digamos, paulatinamen­te. Na verdade, o crescimento das estradas está um pouco ligado ao desenvolvimento de outros sectores e das próprias especifici­dades do trânsito. Não podemos asfaltar uma estrada apenas porque está classificada, pois até nos países desenvolvidos existem estradas de terra.

O que é preciso é garantir a transitabili­dade. E esta não só se pode garantir com uma estrada asfaltada, mas também com uma estrada em terra, desde que seja fei­ta uma boa drenagem e manutenção. Também temos de ter consciência de que o país tem outras prioridades. Precisa de esco­las, de hospitais, de mercados, e o dinheiro que o país dispõe - ou que possa ir buscar - tem de ser dividido entre vários sectores. A electricidade, estradas e o abastecimento de água são prioridades do governo, mas tam­bém há agricultura, indústria e sectores so­ciais. Os planos são normalmente integrados e crescem todos com uma certa lógica de de­senvolvimento.

Falou em 2014. Existem, em termos numé­ricos, objectivos de asfaltagem de estradas até esse ano?

A estrada entre Lichinga e Montepuez vai arrancar. Também já temos garantias de fundos para a estrada Nampula-Cuamba, e que estará executada até 2014. Temos pro­messas de inauguração da ponte sobre o rio Rovuma até Dezembro próximo, e estamos a tentar junto de algumas instituições finan­ceiras pedir o financiamento para essa estra­da, porque também tem de estar concluída quando a ponte estiver terminada. Vamos também fazer a ligação Mocímboa da Praia até à fronteira Namoto, e manter a estrada a funcionar. Depois, vamos fazer o troço Mi­lange-Mocuba, que também já tem financia­mento. Estamos a tentar conseguir financia­mento para a estrada Nampula-Moma com a possibilidade de ir até Angoche. Estamos a fazer a estrada Xitima-Mágoè até à fron­teira com o Zimbabwe e vamos iniciar, pró­ximo ano, os troços Chimoio-Sussundenga e Caniçado até Chicualacuala e também já temos dinheiro para a sua construção. Es­tamos a tentar arrancar, de facto, com este nosso grande projecto que incluiria a ponte Catembe-Maputo. Esta ainda não tem garan­tias de financiamento, mas há boas perspec­tivas e a prioridade é definida pelo governo.

Estamos a falar de quantos quilómetros de asfaltagem e de que investimentos?

Eu diria que os últimos investimentos feitos, a partir de 2007 e 2008, têm sido na ordem de 280 a 300 milhões de dólares por ano. Esse é o número que estamos a tentar obter para criar e manter uma rede principal, uma “es­pinha dorsal” em asfalto e, ao mesmo tempo, garantir a manutenção de outras estradas em terra, porque este valor inclui não só essas es­tradas, mas também a manutenção e os me­lhoramentos que temos que fazer nas redes provinciais, que são a medida sem a qual toda esta rede que é a “espinha dorsal” deixa de ter sentido. Há um outro aspecto que para nós seria muito interessante mas ainda não temos financiamento, que é ligar Pafúri à EN1, atra­vessando as províncias de Gaza e Inhambane. Este seria interessante porque todo o turista que vai a Inhambane e que tem origem na África do Sul, ao invés de ir primeiro a Ma­puto para, depois, seguir a Inhambane, teria acesso directo. Isto são cerca de 400 quilóme­tros e está dentro das nossas espectativas.

Qual é o valor do financiamento que foi garantido?

Os nossos parceiros normalmente entram, mais o valor de receitas fiscais de combus­tíveis, na ordem de 100 milhões de dólares por ano, que vai para as estradas. Nós temos a contribuição dos parceiros de desenvolvi­mento na ordem dos 200 milhões de dóla­res por ano. Não é sempre o mesmo valor, porque depende dos projectos que entram em funcionamento, mas este é mais ou menos repartido em um ou dois terços. E os principais parceiros até agora, além do Banco Mundial, que tem sido um parceiro tradicional, são o Banco Africano de Desen­volvimento (BAD), que está com grandes perspectivas de financiamento, o governo japonês e a Comissão Europeia. Estes são os quatro, digamos, principais parceiros. Te­mos um programa com os americanos, mas é muito limitado. Temos cerca de 120 mi­lhões para fazer aquelas estradas da EN1 de Nampula e Cabo Delgado. Depois há outras contribuições também muito importantes como da Suécia, que nos apoiou na constru­ção da ponte sobre o Zambeze e que foi um parceiro tradicional, mas agora informou-nos que se vai concentrar noutras activida­des do país, e não nas estradas. Também a Inglaterra, Dinamarca e Irlanda são impor­tantes por actuarem na área dos distritos. Por outro lado, temos as Nações Unidas que vão apoiar os mercados agrícolas.

 

Ponte Maputo-Catembe custa 200 milhões USD

Referiu-se à ponte Maputo-Catembe, quando é que vai iniciar, efectivamen­te, a construção?

A ponte Maputo-Catembe é o nosso compromisso. O projecto já está avan­çado, houve um concurso para os can­didatos apresentarem a linha de finan­ciamento, porque a ponte está ligada à estrada para a Ponta do Ouro. E, por­tanto, não é só ponte, mas é também estrada. Só que o investimento é de uma dimensão de centenas de milhões de dó­lares. Estamos convencidos de que ainda neste mandato vai sair, já existe ideia dos acessos, o local. Tem que ser uma ponte muito alta e com pilares de cerca de 300 metros livres de largura, para os barcos poderem passar. E vai ser uma ponte muito bonita.

Quanto é que vai custar?

É possível que a ponte custe mais de 200 milhões de dólares, porque pode chegar a ter quatro quilómetros para poder res­ponder às especificidades e exigências do porto. Será um grande projecto de desenvolvimento da região sul, Maputo, e dará acesso à Ponta do Ouro.

As estradas terciárias e vecinais são as menos asfaltadas e em avançado esta­do de degradação, apesar de também contribuírem para o escoamento da produção. Existe algum plano concre­to de asfaltagem dessas estradas?

Eu diria que nós descentralizámos os fundos para as províncias. São elas que gerem esses fundos, porque estão em melhores condições de saber ao detalhe o grau de importância das suas vias. Não é possível fazer tudo, mas é preciso defi­nir prioridades. Em cada província, exis­te uma Comissão Provincial de Estradas que integra o sector privado, particular­mente os transportadores, para além das direcções e dos governos provinciais. No princípio de cada ano, eles definem as prioridades e as instituições centrais não têm qualquer imposição. Até têm a liberdade de mudar de ideias durante o ano, desde que nos digam as razões da mudança. No momento em que uma daquelas estradas passa a ter um nível de tráfego demasiado elevado para se man­ter como estrada de terra, entra, depois de uma proposta da província, para o programa central para ser asfaltada, e co­meçamos aí à procura de financiamento, tanto interno como externo. A descen­tralização é cada vez maior e nós temos uma consciência muito clara que só com uma descentralização muito activa é que é possível a resolução de problemas que, na sua maioria, têm origem local.

 

Doadores continuam a atrasar o desembolso de fundos

Mesmo com a descentralização, o empre­sariado tem-se queixado do mau estado das estradas, principalmente, a nível da zona norte do país. Não acha que devia haver um acompanhamento continou da situação das estradas a nível do Governo central?

Não há dúvidas. O dinheiro pode não ser suficiente para fazer tudo. Esta é uma questão. Agora, a descentralização é efec­tiva. Os distritos não estão suficientemen­te apetrechados sob o ponto de vista de gestão financeira, e estamos a colocar di­nheiro para eles numa conta à parte, mas gerido a nível da província. Como o sec­tor de estradas é auditado anualmente por auditoria externa, como muitas vezes pela repartição de finanças, e com muita razão porque consumimos muito dinheiro, te­mos que prestar contas da forma contabi­lística como efectuamos as despesas.

Algumas vezes, o Governo queixou-se da demora na execução de alguns pro­jectos devido ao atraso no desembolso dos fundos por parte de alguns parcei­ros de cooperação. Neste momento, o que está a acontecer com os desembol­sos? Há atrasos?

Podemos dizer, de forma generalizada, que há atrasos. Os parceiros também têm as suas próprias dificuldades orçamen­tais, embora, às vezes, não pareça. Mas, muitas vezes, são problemas de proce­dimentos. Nós queremos caminhar para que primeiro o governo crie um progra­ma, em que os parceiros participem fi­nanceiramente. E, para isso, criámos uma conta a que chamamos “indicador do de­sempenho”. Ao invés de ser projecto por projecto passa a ser por programa.

Os doadores já exigiram que o Fundo de Estradas passasse a médio prazo para a tutela do Ministério das Finanças, de modo a que os apoios para o sector vies­sem em forma de ajuda ao orçamento. Acha que esta mudança afectaria a for­ma de funcionamento do sector das es­tradas?

Essa questão foi colocada por um dos parceiros, à semelhança do que aconte­ce num ou noutro país. Mas, de facto, o próprio Ministério das Finanças não tem essa perspectiva porque, inclusivamente, numa gestão global em que os fundos, desde que auditados e objecto de uma gestão credível, fazem todo o seu traba­lho, aliviando o peso do Ministério. To­dos os fundos estão contemplados no or­çamento. Não há qualquer possibilidade de haver fundos extra-orçamento, o que quer dizer que não há possibilidade de desvio de fundos.

Quando reparamos no balanço do Pla­no Económico e Social, sobretudo o de 2008, verifica-se que, de facto, há in­cumprimento das metas em termos de reabilitação e manuntenção das estra­das no país. O que estará por detrás des­se incumprimento?

O que aconteceu muito recentemente foi que os preços de construção de estradas e pontes cresceram muito rapidamente. Nós achamos que nem tudo se pode explicar com o aumento do preço de combustí­veis. Consideramos que, como qualquer lei de economia do mercado, diminuiu o número de empreiteiros, primeiro devido ao campeonato do mundo que, ao reali­zar-se na África do Sul, levou todos os em­preiteiros sul-africanos para lá de forma a responderem à emergência dos empre­endimentos em estradas. Mas há também razões conjunturais que concorreram para isso. Quando a oferta é pouca, os preços sobem. Como consequência disso, por exemplo, as obras Xai-Xai-Chissibuca e Massinga-Nachengue, praticamente du­plicaram e, em alguns casos, mais do que o dobro do preço que o consultor internacio­nal deu ao Banco Mundial há dois ou três anos. Os atrasos normalmente começam quando são lançadas as obras, porque se leva muito tempo a discutir valores com os financiadores. Pode lançar-se o arranque da obra em Janeiro e ela acabar começan­do em Dezembro. Quando a obra começa, normalmente já temos dinheiro. O proble­ma é garantir recursos à partida.

Isso terá afectado também o volume de trabalho no sector de estradas que foi dimuindo ao longo dos anos...

Com certeza. Em 2009, fizemos bastante menos do que devíamos fazer. Em 2008, tínhamos previsto fechar as obras Jardim-Benfica, Xai-Xai-Chissibuca e Massinga-Nachengue, que só começaram em 2009 e já no segundo semestre, por se ter fica­do quase um ano a discutir com o Banco Mundial. Acabámos por tirar a estrada Massinga-Nachengue e obtivemos um fi­nanciamento de Portugal.

O acesso à cidade de Maputo é feito através da EN1 e da EN4. Com o au­mento do número de automóveis e da actividade comercial, as entradas ficam congestionadas. Há uma solução em vista para descongestionar a capital?

Sem dúvidas. A Administração Nacional de Estradas é que faz os estudos e está a trabalhar com os consultores para coor­denar com o Conselho Municipal da Ci­dade de Maputo. Este trabalho visa ava­liar a cidade e todas as entradas possíveis. Temos várias soluções: por Laulane, por Marracuene, ligando a EN4 e EN1 sem passar pela cidade de Maputo.

 

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