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As Eleições de 2010

Boa Sorte aí, Dona.

Não tenho conselhos a dar para a presidente eleita (nem ela mos pediu), porque o discurso dela de ontem incluiu boa parte dos temas que discuto no NPTO. Como vocês devem ter imaginado, gostei do Palocci no palco e torço para que ele seja forte no novo governo. O principal desafio ao novo governo será o cenário econômico internacional, e é preciso bom senso nesse negócio. O resto que eu defendo vocês já sabem: educação desde a pré-escola, política de inovação, equilíbrio fiscal, etc., etc.

Acho que o PT é que precisa se posicionar melhor nos próximos anos, fazendo a reformulação teórica social-democrata com a qual tanto já lhes enchi o saco. É possível que haja uma reformualação partidária razoável nos próximos anos, e o PT precisa firmar seu lugar como alternativa social-democrata.

Fora isso, o que eu acho da eleição 2010 é o que se segue.

1.

O discurso do candidato derrotado tem, entre outras funções, a de consolar os eleitores que lutaram pelo projeto que não vingou. Nesse sentido, o discurso de concessão de Serra foi brilhante: porque depois de uma merda de discurso daqueles, ninguém mais pode ter ficado triste por ele ter perdido.

Manda a tradição que o candidato derrotado discurse primeiro, reconheça a derrota, e deixe a atenção se concentrar no ato principal, o vencedor. Serra não fez isso. Só apareceu depois de Dilma, a quem deu uns parabéns muito chulés, sussurrados entre os dentes, e usou o discurso para dizer para o Aécio que ele é um muiézinha por não ter dado Minas de presente pra ele, só porque ele sabotou as prévias que o Aécio queria mimimi mimimi.

É assustador como Serra sai menor dessa eleição. Entrou como uma possível síntese entre a direita tradicional e alguns aspectos interessantes do lulismo, com algum tempero desenvolvimentista. Alguns meses campanha adentro, e chegando no segundo turno meio no susto, virou símbolo de uma direita mais rancorosa do que propriamente ideológica, que vê na vitória do PT não propriamente uma ofensa a seus valores, mas uma ousadia contra seu direito sagrado de governar. Excetuados os trolls de sempre (inclusive os que escrevem em jornal), todo mundo sempre soube que Dilma era favorita, mas há maneiras e maneiras de perder, e Serra escolheu a mais feia.

Enfim, resta desejar boa sorte à oposição, que ela consiga se reorganizar e se renovar. Eventualmente, a direita vai voltar a vencer, e esperamos que então já seja bem melhor do que é.

2.

Roberto Freire acha que Marina vai se ferrar por ter ficado neutra. Roberto Freire é o cara que teve 100 mil votos contando com toda a máquina de campanha do PSDB paulista. Marina Silva foi quem teve 20 milhões concorrendo pelo PV. Mesmo assim, o Freire acha que ele é quem tem que dar conselhos para ela.

O que a frase do Freire indica é que setores mais raivosos da direita, como o PPS, pretendem ferrar Marina. Se tiver a briga, aposto minha grana na dona. É possível que Marina Silva, como candidata da esquerda não-petista, seja o novo “nãããããão…devia ser eu no seu lugar…buááááááá” do imaginário de Roberto Freire, substituindo Lula, que instaurou-se no topo da lista de rancores de Freire na época em que ele queria ser líder do proletariado.

Não sei o que Marina fará, mas já fez bastante. Acho que é candidata a presidente, mas, mais importante, é a grande referência do ambientalismo brasileiro e deve continuar a sê-lo por muitos anos ainda.

3.

Álvaro Dias sai da eleição como único sujeito que perdeu para o Índio da Costa em 2010.

4.

Inacreditável que alguém como o Xico Graziano, que é um quadro razoavelmente esclarecido, resolva lavar roupa contra o Aécio no Twitter no dia da eleição. Que os blogs puramente militantes, como o Coturno Noturno ou o Reinaldo Azevedo, o façam, tudo bem, mas o Graziano deveria estar entre os interlocutores adultos.

No fundo, o que não parece ocorrer a ninguém ali é que talvez a imensa popularidade de Aécio em Minas se deva também, em algum grau, ao fato dele ter hostilizado muito menos o Lula do que o PSDB paulista. Se isso for verdade, não espanta que muita gente que votou em Aécio tenha preferido Dilma.

A atitude “não era eu que tinha que ganhar, eram os outros que tinham que ter me dado de presente” que se vê nas falas de Graziano (ou no silêncio de Serra ontem) sobre Aécio, ou na fala de Freire sobre Marina, explicam bastante porque o PT continua ganhando.

5.

E, para comemorar a derrota, uma preiboizada resolveu lançar uma campanha contra os nordestinos no Twitter, já dando aos dilmistas material de campanha para 2014.

6.

Em um artigo que saiu no Valor logo no começo do segundo turno, o Alberto Carlos Almeida fez um negócio corajoso e continuou apostando na vitória da Dilma, porque era isso que indicavam todos os fatores que a ciência política aprendeu a considerar importantes. Ele tinha razão, mas a eleição de 2010 mostrou também os limites de toda reflexão sobre política, por mais rigorosa que seja.

Como ele mesmo admitiu, o fenômeno Marina era absolutamente imprevisível na dimensão que tomou: isso já mostra o quanto é difícil mesmo saber quem são os jogadores que contam na hora de fazer seu modelo. Os indicadores favoreciam a vitória de um candidato situacionista, mas o que fazer, na previsão, com um candidato meio híbrido de situacionista e oposicionista como Marina? Poderia ter ficado no traço, poderia ter vencido, é difícil saber.

E a agenda religiosa mostrou que, pelo menos em alguns casos, valores muito arraigados podem atropelar considerações econômicas na decisão do voto. Sim, no final venceu o “it’s the economy, stupid”, mas não foi só isso que aconteceu.

Ciência política é maneira porque é difícil.

7.

Já falei pra Dilma ter muito cuidado na condução da economia? Ah, já? Mal aí.

8.

Troféu Imprensa NPTO 2010:

Melhor cobertura jornalística: Valor Econômico, com vários corpos de vantagem. Mas é difícil comparar o Valor com os jornais de maior circulação, porque é de se esperar que um troço mais intelectualmente elitizado, voltado a um público mais restrito, seja  mais analítico. Entre os jornalões, voto na Folha, pelo furo espetacular do telefonema para o Gilmar Mendes. Entre os populares, o Meia Hora, pela manchete de hoje, “Dilma Descabela o Careca”.

A propósito: a média da Veja esse ano foi horrenda, começando antes mesmo da eleição com a falsificação do depoimento do Eduardo Viveiros de Castro (que não vale para propósito desse prêmio, pois não foi sobre eleição) mas a denúncia da Erenice era verdade, e foi um belo furo. Com isso o troféu de pior coisa vagamente jornalística desse ano vai para as capas “Hora do Povo com sinal trocado” do Globo, que muitas vezes afastavam o leitor não-rudimentar de matérias e colunas interessantes na parte de dentro do jornal. Entretanto, não tem como o troféu de pior capa não ir para o Estadão, que manchetou uma pesquisa em que nada tinha acontecido como “Dilma para de subir e Serra, de cair”.

Melhor furo jornalístico: empate entre a denúncia da Erenice e o telefonema do Gilmar, mas pendente: se Aécio formar mesmo outro partido, Carta Capital vence com vários corpos de vantagem. A Carta Capital também leva o troféu “melhor análise do fenômeno Marina Silva“, para Antônio Luís da Costa, cujo livro de ficção científica, aliás, preciso ler.

Melhor lenda urbana: Michel Temer satanista, sem dúvida. Só não fiz mais piada sobre isso porque tive medo de alguém acreditar que era verdade, mesmo.

Melhor previsão no quesito “comédia involuntária”: DataCésar, que descobriu que a verdadeira popularidade do Lula era só 10% 15% 30%, certo, 60%, tá, 80%, ah, putaqueopariu, eu pelo menos não gosto dele. Menção honrosa para o GPP, que o inevitável Índio da Costa contratou semana passada para “animar a militância”. E ainda menção honrosa para o DataLourival, que em Junho ainda garantia que tinha informações das internas dizendo que o Aécio seria vice. Hors Concours: esse vídeo (hat tip: André).

Troféu “Deixa que a Natureza Marca”: José Serra, por dizer no debate que Marina e Dilma eram iguais. Já mostrei o vídeo aqui? Ah, já?

Revelação quesito “deixa que a natureza marca”: Weslian Roriz, que prometeu construir metrô para cidades que não existem (hat tip: Bruno). Ah, Índio, se soubesse o quanto você deve a essa mulher.

Troféu mascote: polvo da Veja, é claro.

Melhor troll do NPTO: Lourival Pessanha. Chato e meio escroto, mas, comparado aos caras que me apareceram aqui depois, um Voltaire.

Melhor comentarista já famosão do NPTO: João Paulo Rodrigues.

Comentarista revelação do NPTO: Vinícius, do Relances, que, aliás, divide com o Igor o troféu “melhor liberal não-encachaçado nas idéias” de 2010. Nenhum dos dois pode concorrer nos próximos anos, o que me leva a crer que, se ninguém ressucitar o Merquior, este é o último ano em que o prêmio é entregue.

Melhor Japonês com apelido engraçado: Japajato.

Melhor Blog: Hermenauta, pelo mês de Janeiro.

PS: já consertado o link do Relances, mal aí, Vinícius, achei que sabia de cor.

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139 Comments

  1. Também gostei do discurso da Dilma, e o choro pareceu real. Os grandes problemas que a esperam nos próximos 4 anos são:

  2. pelvimax says:

    Todos os candidatos fizeram uma grande campanha este ano. Mas só um pode ganhar.

  3. Discursos políticos são sempre relativos. Não acreditar em nós nada.

  4. Concordo totalmente com o post. Fiquei encantado.

  5. Você fez um ótimo análise. Concordo totalmente com quase todos os pontos. Uma saudação.

  6. gafas madrid says:

    Muito boa análise. Que todas as campanhas são bem como o que foi contestado esta. Uma saudação.

  7. inglesmadrid says:

    Bom escolhas e aqueles muito discutido

  8. As eleições em nosso país são um grande exemplo para o resto do mundo .

  9. Octavio Push says:

    É certamente um compliado tema, obrigado por compartilhar mucuas muito recordou-me um link que eu vi em um site de uma Agencia de Marketing Digital

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