Eleições Europeias

Rumo a uma vitória que “sabe a pouco”? /premium

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Com o lançamento de campanha para as europeias, fica a incerteza sobre se esta estratégia não empurrará o PS para uma vitória que “sabe a pouco” – isto é, a repetição do fracasso eleitoral de 2014.

Começou a campanha informal para as eleições europeias. E se há algo de previsível nas campanhas das eleições europeias é que pouco ou nada os partidos são capazes de discutir sobre a Europa. Pouco, porque se discute com superficialidade (por exemplo, a ameaça dos radicalismos às democracias liberais) ou porque o que aquece os debates são os fundos comunitários, mostrando que a União Europeia das liberdades pode ser muitas coisas, mas que o seu alicerce é o dinheiro que injecta no país. Nada, porque afinal tudo se define em função da política interna – com elogios ou críticas ao governo. Ora, no meio de um fim-de-semana de irrelevâncias, só houve um ponto digno de realce: a continuar assim, a campanha eleitoral do PS será um desastre. Por detrás das luzes e do espalhafato cénico, viu-se um PS assombrado pelas ilusões que criou e das quais ficou refém – a do “PS virou a página da austeridade”, a do “PS é renovação” e a do “a geringonça é um projecto com futuro”. Se o plano é levar essas ilusões a votos, o PS está a fabricar um fracasso.

É preciso um certo atrevimento para, em 2019, se defender que o governo PS virou a página da austeridade. A ideia já nem sequer opõe esquerda e direita – é matéria de consenso que esse virar de página foi desmentido pelas evidências e pelos relatórios orçamentais vezes sem conta. Afinal, o esforço fiscal exigido aos portugueses é o mais elevado de sempre, os serviços públicos estão financeiramente estrangulados e em pré-ruptura, o investimento público realmente executado está muitíssimo abaixo dos compromissos do governo. Mas atrevimento não faltou a Augusto Santos Silva, que estabeleceu o mote da campanha eleitoral socialista, e que elevou o governo PS a farol de uma Europa à deriva: segundo ele, “começou em Portugal um novo futuro para a UE depois da crise, que prova que nos nossos compromissos comuns cabem políticas diferentes”. Se fosse na América de Trump, não faltaria quem chamasse a isso “facto alternativo”.

A isso e a isto também: o PS lançou a campanha das eleições europeias apresentando-se como o motor da renovação política. Isto porque Pedro Marques, o seu cabeça-de-lista, será um estreante no parlamento europeu – ao contrário de Paulo Rangel (PSD) e Nuno Melo (CDS). Ora, o problema deste motor é que encrava ao arranque: Pedro Marques não é propriamente um novato nas andanças políticas – pelo contrário, toda a sua vida profissional está ligada à política e ao PS, com destaque para ter sido secretário de Estado nos governos de Sócrates, deputado e actualmente ministro no governo de António Costa. “Como é que é possível ser portador do futuro com as caras do passado?”, atirou Augusto Santos Silva a pensar nos seus adversários políticos. A pergunta é boa, a resposta do PS é má.

Por fim, a ilusão sobre o inconciliável: as críticas do PS ao radicalismo dos partidos à sua esquerda fazem sentido no contexto eleitoral, mas também são uma espécie de tiro-no-pé, pois salientam o lado negro da geringonça. Foram duras (e justas) as críticas de Augusto Santos Silva contra o eurocepticismo de BE e PCP, partidos que defendem “a saída da zona euro” ou a “reestruturação unilateral da dívida” e que “ainda hoje duvidam e contestam o projecto europeu”. Mas o PS tem também de responder à dúvida que estas críticas impõem: como é que pode um governo defender os interesses de Portugal na Europa e decidir em função dos superiores interesses nacionais quando a sua base de apoio político está, precisamente, nos partidos eurocépticos que duvidam e contestam o projecto europeu? Não pode.

O que fica, portanto, deste fim-de-semana de lançamento das eleições europeias? Fica a incerteza sobre se esta estratégia de acumulação de ilusões não empurrará o PS para uma campanha eleitoral falhada e, consequentemente, a uma vitória que “sabe a pouco” – isto é, a repetição do fracasso eleitoral de 2014, agora a poucos meses das eleições legislativas. Quando já não faltam reflexões sobre o potencial descalabro eleitoral do PSD, percebeu-se que importa juntar à equação a hipótese que todos descartaram: a de um fraco resultado eleitoral de um PS em queda, refém das ilusões que criou, sucessivamente confrontado pelas evidências dos seus fracassos e incapaz de defender a sua governação debaixo do fogo da campanha eleitoral. É pouco provável? Talvez seja. Mas a história prega partidas e a maior de todas é repetir-se quando menos se espera.

Agora que entramos em 2019...

...é bom ter presente o importante que este ano pode ser. E quando vivemos tempos novos e confusos sentimos mais a importância de uma informação que marca a diferença – uma diferença que o Observador tem vindo a fazer há quase cinco anos. Maio de 2014 foi ainda ontem, mas já parece imenso tempo, como todos os dias nos fazem sentir todos os que já são parte da nossa imensa comunidade de leitores. Não fazemos jornalismo para sermos apenas mais um órgão de informação. Não valeria a pena. Fazemos para informar com sentido crítico, relatar mas também explicar, ser útil mas também ser incómodo, ser os primeiros a noticiar mas sobretudo ser os mais exigentes a escrutinar todos os poderes, sem excepção e sem medo. Este jornalismo só é sustentável se contarmos com o apoio dos nossos leitores, pois tem um preço, que é também o preço da liberdade – a sua liberdade de se informar de forma plural e de poder pensar pela sua cabeça.

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