Guerra subterrânea


Guerra subterrânea

As minas foram as mais temidas de todas as armas que os nossos militares enfrentaram nos três teatros de operações. Utilizadas de forma isolada, ou conjugadas com emboscadas, limitaram fortemente a mobilidade das forças portuguesas em acções tácticas e logísticas, apeadas ou em viatura, sendo também responsáveis por atrasos nos reabastecimentos, por destruições em veículos e, acima de tudo, por elevada percentagem de baixas.
 
Embora a estatística não esteja feita, amostragens dos três teatros de operações permitem considerar que, no mínimo, 50 por cento das baixas portuguesas (mortos e feridos) foram provocadas por engenhos explosivos. Um tipo de guerra altamente compensador para os movimentos de libertação, cujos objectivos eram apresentados do seguinte modo, nos apontamentos de um curso frequentado na Argélia por quadros do PAIGC: «Realiza-se a guerra de destruição e de minas para fazer obstáculo atrás dos inimigos, para aniquilar as suas armas, modernas, ameaçá-los e paralisá-los.»

Contudo a utilização das minas na guerra não foi exclusivo dos guerrilheiros, pois as forças portuguesas também fizeram largo emprego delas e de outros engenhos explosivos, usando-os na defesa das suas instalações, para proteger as tropas em operações e para provocar baixas, mas, ao contrário dos guerrilheiros, recorreram maioritariamente às minas anti-pessoais e às armadilhas com granada explosiva de fragmentação e rebentamento instantâneo, detonada através de arame de tropeçar. Por parte dos movimentos de libertação, além das minas anti-carros foram também utilizados «fornilhos», quase sempre constituídos por granadas de mão, de morteiro e de artilharia, não rebentadas, e bombas de avião conjugadas com explosivos e accionadas por mecanismo de explosão - detonador eléctrico ou pirotécnico. Os «fornilhos» eram colocados nos itinerários e conjugavam o efeito das minas anti-carros com as minas antipessoais.

A primeira mina utilizada pelos movimentos de libertação contra as forças portugueses era antipessoal (A/P) implantada na estrada Zala-Vila Pimpa, no Norte de Angola, em 6 de Junho de 1962.
A primeira mina anticarro (A/C) surgiu seis dias depois, em 12 de Junho de 1962, na pista da povoação do Bembe. Em 1963, a colocação de engenhos explosivos estendeu-se ao Leste e a Cabinda.

Na Guiné, a primeira mina referenciada era anticarro, colocada na estrada Fulacunda/São João, em Julho de 1963, tendo sido aqui também utilizadas minas aquáticas nos rios, que chegaram a inutilizar lanchas. Um documento elaborado depois de uma operação realizada, em 1970, por um DFE e por uma secção de mergulhadores sapadores refere a existência de engenhos explosivos submersos colocados na confluência do rio Cobade com o rio Como, reunidos num grupo de quatro a seis flutuadores, bem como a suspeita de «outros objectos flutuando a meia água que denunciam a existência de um campo de minas estendendo-se por uma zona de cerca de seiscentos metros».

Em Moçambique, o aparecimento de engenhos explosivos ocorreu em 29 de Maio de 1965, em Nova Coimbra, no Niassa, e em 4 Julho, em Nancatari, Cabo Delgado, enquanto a primeira mina antipessoal (A/P) surge em 14 de Junho, em Cobué (Niassa), e a primeira anticarro (AlC) em 10 de Outubro, em Sagal (Cabo Delgado), na estrada Mueda-Mocímboa da Praia.

Ao longo dos anos da guerra, a utilização de minas por parte dos guerrilheiros nos três teatros de operações teve a máxima expressão em Moçambique. Primeiro nas zonas do Niassa e de Cabo Delgado/Mueda e, posteriormente, na de Tete/Cahora Bassa. Moçambique reunia as condições ideais para a utilização deste tipo de arma por parte da Frelimo, pois as vias de comunicação indispensáveis às forças portuguesas eram extensas e más, não existindo nas zonas de guerra estradas alcatroadas.

Por seu lado, os guerrilheiros dispunham da vantagem de as acções bélicas se desenrolarem relativamente próximo das suas bases logísticas, o que facilitava o transporte do grande volume de cargas que a guerra de minas exige. Não admira pois, que em Moçambique os principais itinerários de reabastecimento das forças portuguesas se tenham transformado em verdadeiros campos minados.

No início dos anos 1970, o percurso de cerca de duzentos quilómetros entre Mueda e Mocímboa da Praia, chegou a demorar onze dias, quando habitualmente era percorrido entre quatro a seis horas, e num só quilómetro de estrada encontraram-se, frequentes vezes, mais de setenta minas!

No Niassa, nas estradas que irradiam de Vila Cabral para para Metangula, Nova Viseu ou Tenente Valadim, as minas, associadas à quase inexistência de vias, ao clima chuvoso e ao terreno ravinado, junto ao lago transformaram os movimentos necessários à sobrevivência das tropas e ao seu emprego em combate em operações de grande duração e desgaste, que esgotavam só por si as suas capacidades e lhes retiravam a iniciativa.

É ainda em Moçambique que se regista o maior emprego de minas por parte das forças portuguesas. O general Kaúlza de Arriaga, em carta ao ministro da Defesa, Sá Viana Rebelo, em 29 de Janeiro de 1973, solicitou o fornecimento de cento e cinquenta mil minas antipessoais para Cahora Bassa e um milhão para interdição da fronteira norte, junto ao rio Rovuma.

Num ponto de situação feito ao comandante-chefe, em Vila Cabral, foi referido que na zona do Niassa, em 1972, os guerrilheiros haviam realizado 412 acções, das quais 223 foram colocação de engenhos explosivos (54 por cento do total). Destas, 78 foram accionados pelas forças portuguesas, que sofreram 43 mortos, 51 feridos graves e 151 feridos ligeiros.

De 1964 a Junho de 1970, foram detectadas pelas nossas tropas, 5290 minas e engenhos explosivos, dos quais 1894 accionados por militares ou viaturas.

Em Moçambique, tal como em Angola, no caminho de ferro de Benguela, também nas linhas férreas da Beira e de Nacala foram implantadas minas, que dificultaram o transporte de mercadorias e reabastecimentos, obrigando a complexas e desgastantes operações de escolta . 

                                                               Guiné 1971 
                                            Implantadas              Neutralizadas
Antipessoais (A/P)                  371                              324
Anticarros (A/C)                          92                                69
Minas aquáticas                           4                                  4
Armadilhas                                  19                                13
Outros                                             3                                   -
- Total                                          489                              410 

                                                                 Guiné 1972 
                                              Implantadas               Neutralizadas
Antipessoais (A/P)                    398                               295
Anticarros (A/C)                            96                                 69
Minas aquáticas                             -                                    -
Armadilhas                                    11                                   2
Outros                                             13                                   6
- Total                                             518                              372


Índice
1 - Guerra subterrânea
2 - Minas