Vencendo a amargura com as bem-aventuranças

Quando a amargura começa a queimar por dentro

            Recentemente, tive a oportunidade de conversar com uma mulher, que iremos chamar de Maria (um pseudônimo). Ela se divorciou há três anos, mas teve uma transição muito difícil para a vida de solteira. Maria é cristã há quase quarenta anos. Seu marido também é cristão, mas se envolveu em um relacionamento extraconjugal. Eles procuraram aconselhamento pastoral, mas ficou claro para o pastor que o marido não estava realmente comprometido em cortar o relacionamento com a outra mulher. Então, Maria buscou o divórcio—e com o divórcio, ela buscou a amargura.

            Maria parou de orar e parou de ler as Escrituras regularmente. Ela continua envolvida em sua igreja, mas emocionalmente, ela se sente distante do Senhor e da maioria das pessoas (casadas!) que ela conhece.

Como as bem-aventuranças eliminam a amargura

            Que direção você recomendaria para o aconselhamento de Maria? Uma abordagem é inspirada nas bem-aventuranças de Mateus 5.2–12. Você não começaria, necessariamente, chamando a atenção dela diretamente para as bem-aventuranças, mas poderia mantê-las em mente como diretrizes para aconselhá-la.

            As bem-aventuranças são declarações sobre o status privilegiado (bem-aventurança) que um relacionamento com Cristo confere aos crentes.[1] Certamente, Maria não se sente “bem-aventurada”[2] agora. No entanto, poucos americanos modernos se descreveriam como “bem-aventurados” caso se considerassem “pobres de espírito”, “pesarosos”, “perseguidos” ou “famintos”. Tudo isso sugere que é necessário um modo diferente de encarar a vida para apreciar verdadeiramente o que Jesus está dizendo com essas bem-aventuranças. Embora Maria não pense inicialmente sobre essas declarações de bem-aventurança, como uma filha de Deus, elas ainda assim são verdadeiras para ela. Essa realidade pode ajudá-la, com o tempo, a se recuperar de seu divórcio e redirecionar sua nova vida como uma mulher solteira para os propósitos do glorioso reino de Deus para ela.

            Aqui estão alguns exemplos de como as bem-aventuranças poderiam ser usadas para ajudar Maria a eliminar sua amargura:

O conforto de Deus afasta a amargura

Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados.” (Mateus 5.4)

            Em um mundo caído, há muitas causas para o luto, pois existem muitos tipos de perdas. Maria compreensivelmente lamentou profundamente as perdas que sofreu devido ao pecado do marido e ao divórcio. Você faria bem em reconhecer, juntamente com ela, essas perdas reais. Empatia cria conexão (cf. Romanos 12.15).

            Porém, é igualmente verdade que devemos reconhecer a realidade da presença consoladora de Deus em meio ao nosso sofrimento. O marido de Maria a deixou; Deus, seu pai, não. Ignorar essa realidade criará mais uma causa para o luto!

            Além disso, neste contexto, a causa específica do luto que Jesus provavelmente tinha em mente era o reconhecimento de que nossa pecaminosidade vai contra aquilo que Deus merece—nossa honra, admiração, obediência, adoração, etc. E isso é relevante para a situação de Maria.

            A amargura de Maria a deixou cega para suas próprias contribuições para o divórcio (perfeccionismo e a crítica excessiva e desnecessária ao marido). Enquanto ela estiver cega pela amargura, o conforto de Deus também parecerá ilusório para ela.

A humildade espiritual afasta a amargura

“Bem-aventurados os humildes de espírito, porque deles é o reino dos céus.” (Mateus 5.3)

            Quando Jesus se refere aos “humildes de espírito”, ele está enfatizando que nossas necessidades básicas são muito mais profundas do que comida e água (ou o dinheiro para comprá-las). Fundamentalmente, como pecadores, precisamos desesperadamente da misericórdia e da graça de Deus. A boa notícia é que aqueles que reconhecem essa necessidade absoluta da misericórdia e da graça de Deus são aqueles que as receberão! Deles é o reino dos céus; eles têm um relacionamento seguro com Deus.

            Pode-se pedir a Maria que reflita sobre a época em que se sentiu atraída pela primeira vez à Jesus como Salvador. Essa foi uma época em que a realidade de seu pecado—e sua necessidade da misericórdia e da graça de Deus—motivou uma grata apropriação do evangelho. Ela precisa recuperar essa preciosa atitude novamente.

A mansidão afasta a amargura

“Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a terra.” (Mateus 5.5)

            Amargura e mansidão são polos opostos. A amargura é uma ira que arde lentamente, alimentando desejos, pensamentos e ações vingativas. Ela exige a satisfação do nosso senso pessoal de justiça. Em contraste com a amargura, a mansidão combina gentileza, humildade e submissão à autoridade de Deus. Não há demanda por justiça pessoal, mas sim uma aceitação de que a justiça de Deus será aplicada como ele achar adequado.

            Neste momento, Maria acha que perdeu tudo por causa das aventuras sexuais injustas de seu marido. De fato, suas perdas são reais e os pecados do marido são injustos. Mas sua amargura limitou tanto sua perspectiva, que ela perdeu de vista sua herança completa como filha de Deus. Sua amargura jamais garantirá para ela qualquer futuro que se compare ao que Deus prometeu.

A pacificação afasta a amargura

“Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus.” (Mateus 5.9)

            A amargura separa pessoas de Deus e de outras pessoas. Ela coloca o diabo em uma posição favorável para controlar nossas vidas (Efésios 4.26–27). Enquanto Maria nutre seu rancor, ela se parece mais com Satanás do que com o seu Salvador (cf. Efésios 2.1–16).

            No entanto, Maria foi salva para algo muito melhor. Ela é capaz de resistir ao diabo para que ele fuja (cf. Tiago 4.7). Pode ser que ela não experimente uma restauração no seu casamento, porém, ela pode se esforçar ao máximo para viver em paz com seu ex-marido (Romanos 12.17). Ela pode se disciplinar a orar em favor dele (cf. Mateus 5.44; 1 Pedro 3.9). Além disso, expressões mais tangíveis de serviço podem refletir ainda mais seu papel como filha de Deus.

Perguntas para Reflexão

            Como as outras bem-aventuranças de Mateus 5 podem ajudar a transformar a atitude do coração de Maria? Se você fosse usar as bem-aventuranças para estruturar o aconselhamento de Maria, que perguntas ou ressalvas dela você anteciparia? Como você responderia a ela?

[1] Jonathan Pennington diz que as bem-aventuranças são descrições e convites implícitos para um estilo de vida que resultará em florescimento pleno agora e na era vindoura. Veja Jonathan Pennington, The Sermon on the Mount and Human Flourishing (Grand Rapids: Baker Academic, 2017), 144.

[2] O que significa ser “bem-aventurado”? Claramente, Jesus apresenta o conceito de forma positiva, embora as condições mencionadas na maioria das bem-aventuranças sejam consequências de viver em um mundo caído. Assim, não é útil equacionar “bem-aventurança” com “felicidade” em si. D. A. Carson sugere que a ideia fundamental é ser aprovado ou encontrar aprovação. Veja D. A. Carson, Jesus’ Sermon on the Mount and His Confrontation with the World (Toronto: Global Christian Publishers, 1999), 16. Eu tentei trazer esse aspecto ao dizer “status privilegiado”.

[Este post, de autoria de Jeff Forrey, foi originalmente publicado no blog da Biblical Counseling Coalition. Traduzido por Gustavo Santos e revisado por Lucas Sabatier. Republicado mediante autorização.]

Este artigo tem 1 comentário

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *