RESSIGNIFICAÇÕES DO VIDEOGAME MORTAL KOMBAT NO SOFTWARE
M.U.G.E.N.
Ricardo Cortez Lopes1
RESUMO
Este trabalho busca estudar uma ressignificação expressa através do personagem
da franquia multimídia Mortal Kombat chamado Ermac, modificado na engine (a qual
consideramos como um software aberto) M.U.G.E.N. Após contextualizar a própria
franquia Mortal Kombat, Ermac e discutir o próprio M.U.G.E.N, partimos para a
análise dos sprites do personagem, produzidos ao longo dos anos. Esta produção
conectiva expressou a modificação do personagem de um dos jogos (o Ultimate
Mortal Kombat 3) a partir da recombinação de elementos (ilustrados por imagens),
baseada em criações autorais e em inspirações em versões oficiais posteriores.
Assim, a ressignificação trabalhou no sentido de tomar um contato com o
personagem e o modificar em um sentido que apontamos no decorrer do texto: no
começo, pequenas modificações mais superficiais, seguidas de intervenções mais
profundas e que apontam para o desenvolvimento de saberes. Assim, faz-se uma
sociologia da construção coletiva do conhecimento na era online.
Palavras-chave: M.U.G.E.N; Mortal Kombat; Ressignificação.
ABSTRACT
This paper aims to study a connective intelligence, expressed through character of
the multimedia franchise Mortal Kombat’s Ermac, modified in the engine (which we
consider as an open software) M.U.G.E.N. After contextualizing Mortal Kombat
franchise, Ermac and discussing M.U.G.E.N itself, we set out to analyze the
character’s sprites. Analysis expressed the modification of the character of the
games (the Ultimate Mortal Kombat 3) from the recombination of elements
(illustrated by images), based on author creations and inspirations in later official
versions. Thus, connective intelligence worked to make contact with the character
and modify it in a sense that we pointed out in the course of the text: in the beginning,
more superficial modifications, followed by deeper interventions that point to the
development of knowledge.
Keywords: M.U.G.E.N; Mortal Kombat; Ressignification.
1Doutor e Mestre em Sociologia (UFRGS). Licenciado em Ciências Sociais (UFRGS). Analista
de Educação (Faculdade IBCMED). E-mail: ricardo@ibcmed.org.
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1 INTRODUÇÃO
Neste artigo pretendemos apontar para a ressignificação de jogos de
videogame por via de um software. O jogo em questão é o Mortal Kombat
Project, uma “tradução livre” e criativa dos jogos originais Mortal Kombat -
oriundos da década de 1990 do século XX, produzidos pela empresa Midway -
no software livre M.U.G.E.N, uma engine2 de jogos de luta. Devido aos muitos
elementos envolvidos no jogo - que abrangem desde as obras originais até as
criações autorais dos desenvolvedores - optamos por focar nossa análise em um
personagem, Ermac.
Nossa opção por esse personagem se deu por conta de sua própria
origem: fruto de um erro de processamento no primeiro jogo - sobre o qual
explanaremos adiante, ele foi incorporado oficialmente em jogos posteriores
como um personagem com background. Ou seja, o personagem em si não foi
uma criação apenas de sua equipe, ele foi oportunizado no diálogo com outros
atores sociais, técnicos (desenvolvedores de M.U.G.E.N) e não técnicos.
2 COMO ACONTECE A RESSIGNIFICAÇÃO?
O objetivo geral da pesquisa foi perceber as mudanças da obra original
a partir das diferentes versões do programa, por meio da análise dos fragmentos
simbólicos dispostos nas imagens selecionadas. Assim, os jogos foram
experimentados de maneira imersiva (download e zeramento); contudo, no
método de exposição, optamos por trazer as evidências em imagens retiradas
da Internet - que ilustram páginas de onde tiramos informações.
O critério de seleção foram os MK M.U.G.E.N.S com maior número de
versões; em seguida, promovemos o tabelamento das gambiarras registradas
em screenshot. Assim, o que seriam gambiarras? "Hoje, talvez por uma evolução
do significado, o uso informal do termo muitas vezes reflete idéias como
2Engine, ou motor de jogo, é um programa que consegue ler e articular uma série de arquivos
para criar o ambiente de um jogo.
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"adaptação", "improvisação", "dar um jeito", "conserto" ou "remendo"
(BOUFLEUR, 2006, p.23). O foco dos desenvolvedores pareceu ser recriar a
experiência do jogo 3D (programado pelos desenvolvedores oficiais) em um
ambiente de recursos digitais precarizados (código pronto do M.U.G.E.N). O foco
da análise imagética foram a) Trajes, b) Fatalities, c) Movimentos e d) Pose de
vitória. A partir disso foram gerados os resultados, mostrados nas próximas
sessões.
3 O M.U.G.E.N.
Desenvolvido pela empresa Elecbyte em 1999, o M.U.G.E.N “[...] trata-
se de um motor gráfico, o mesmo é destinado ao desenvolvimento de jogos,
porém com uma facilidade enorme de manejamento. O M.U.G.E.N permite a
criação de personagens e cenários de forma simples e rápida” (VOCÊ, 2015).
Trata-se de um abandonaware3 que programa cenários e personagens em
wordpad4. A sua interface conta com um menu inicial - com os seguintes itens:
Arcade, Treino, Observar, Opções e Sair - e com um conjunto de comandos para
cada personagem (char) - 4 botões direcionais, com mais 6 de ataque
(customizáveis) e com um adicional. A pasta do sistema operacional que contém
o programa possui os seguintes tipos de extensão: SFF (os sprites do jogo),
ACT (a paleta de cores disponíveis), SND (os sons do jogo), CMD (os comandos
de movimento e de ataque), AIR (coloca os SFF em sequência), DEF (define os
arquivos que serão acessados na execução do jogo), CNS , ST e TXT (essas
três últimas acerca da licença de uso do personagem/char).
É possível ao usuário realizar download de personagens e de cenários
(stages), que podem ser inseridos por digitação em um documento chamado
select.def, um bloco de notas. A partir desta base programacional, é possível
criar e recriar os “mais famosos games de luta 2D como Street Fighter e King Of
3 Abandonaware é um programa que foi descontinuado, e sua licença já expirou.
4 Processador de texto do Windows.
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Fighters” (VOCÊ, 2015). No nosso caso de estudo, o objeto é a trilogia clássica
do Mortal Kombat, que foi traduzida da linguagem de programação original para
a linguagem do M.U.G.E.N.
Talvez uma possibilidade de ligação entre conceito e empiria esteja na
própria trajetória da Elecbyte: criada na metade dos anos 1990, ela foi formada
por um time recluso e é amplamente conhecida somente pelo produto M.U.G.E.N
e por seus recorrentes “sumiços” - o primeiro deles em 2003, quando a versão
de Windows ainda não estava terminada por conta de uma “travada”(hit a snag)
experimentada pela equipe (HISTÓRIA, 2008), seguida de uma retomada entre
os anos 2009 e 2015, quando foi apresentada a versão 1.0, seguida de novo
sumiço até os dias atuais (ELECBYTE, S/D). A licença de uso da Elecbyte sobre
o M.U.G.E.N já expirou e não parece estar em vias de ser renovada. Embora a
redistribuição do programa por outros sites seja, essencialmente, ilegal, a
Elecbyte nunca tomou providências legais (HISTÓRIA, 2008). Algumas fontes
da Internet afirmaram que a empresa montava um projeto de financiamento
coletivo e que sumia com o dinheiro sem entregar melhorias no programa.
Em síntese: não existe uma regulação formal e penal do código
programacional, os usuários o mantêm intacto mais por uma questão ética de
comunidade do que por ocultação de recursos. Essa ideia fica reforçada pelo
fato de que os códigos são baseados em texto, pois a Elecbyte pretendia que os
criadores pudessem aprender uns com os outros, mesmo que isso dificulte a
atribuição de permissões entre eles (HISTÓRIA, 2008). Sobre a criação que os
desenvolvedores realizam, há uma regra:
Mundialmente, uma regra é tomada como certa: Você não pode pegar
os códigos de um personagem e usar no seu personagem, sem prévia
autorização. Apesar da linguagem de programação do Mugen ser
interpretada (como HTML) e não única como Linguagem C ou JAVA,
ou seja você não cria códigos exatamente e sim os organiza (haja visto
que você não pode criar funções novas), é de bom tom que você peça
autorização antes de usar qualquer coisa. Muitos criadores permitem
que você use os códigos dele para estudo, mas muitas pessoas
confundem isto: Estudo não quer dizer copiar e colar, mas quer dizer
você entender o código e melhorá-lo (HISTÓRIA, 2008)
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Estabelecidos os parâmetros da relação da empresa com os usuários e
dos usuários entre si, podemos entender, agora, a relação com os copyrights.
De acordo com revisão, conteúdo SFF e SND são de propriedade das empresas
originais (como a Midway ou a Capcom, por exemplo). Já os CMD, AIR e CNS
são propriedades do desenvolvedor individual. É importante ressaltar que muitas
empresas encaram este uso como fanart5 (HISTÓRIA, 2008), e por isso não
cancelam ou proíbem a produção de M.U.G.E.N baseado nos personagens.
4 A FRANQUIA MORTAL KOMBAT E ERMAC: IDAS E VINDAS DO 2D AO
3D
O jogo Mortal Kombat foi uma espécie de resposta ao jogo de luta
japonês chamado Street Fighter II (1987), que foi um grande sucesso comercial
e foi seguido de muitos jogos nele inspirado. O diferencial de Mortal Kombat
estaria em duas características: (1) a utilização de sprites realizados a partir da
digitalização de fotos e (2) a violência (traduzida no sangue e na possibilidade
de execução dos fatalities, movimentos de finalização). É importante ressaltar
que este jogo ajudou a criar o inédito selo para jogos de videogames, até aquele
momento considerados como uma diversão pueril.
Em síntese, no universo de Mortal Kombat existem 4 reinos: Terra
(earthrealm), Inferno (netherrealm), Edência e a Exoterra (outworld). Esses
reinos vivem em constante guerra e ficam tentando se expandir, mas as suas
capacidades bélicas são muito díspares (Edência, por exemplo, foi invadida pelo
imperador da Exoterra, Shao Kahn). As entidades reguladoras chamadas
Deuses Anciões (Elder Gods) optam por intermediar essas relações criando uma
condição para que um reino invada o outro: através de dez vitórias seguidas em
um torneio chamado Mortal Kombat, que une os melhores guerreiros de dois
reinos - que se desenvolve no território do reino que se defende. O vencedor do
5 Obra baseada em personagens ou mesmo outras obras amplamente divulgadas.
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torneio recebia uma extensão de sua vida para poder participar do torneio
posterior.
No contexto do jogo Mortal Kombat, de 1992, a Exoterra havia ganho 9
torneios e estava prestes a obter a autorização para invadir a Terra. Todavia, o
guerreiro shaolin Liu Kang venceu o torneio e interrompeu as vitórias seguidas.
Seria possível reiniciar-se o processo, mas o imperador Shao Kahn decide por
propor uma aposta: se os terráqueos vencessem um novo torneio, realizado na
Exoterra, a Exoterra nunca mais reiniciaria os torneios. Os lutadores da Terra
aceitaram as condições e, novamente, Liu Kang sagrou-se o vencedor ao
derrotar o próprio Shao Kahn. Este foi o contexto do jogo Mortal Kombat II, de
1993. No Mortal Kombat III (de 1995), Shao Kahn decide por invadir de vez o
plano terreno com o seu exército, com a justificativa de que sua esposa, Sindel
(rainha de Edênia antes da invasão), havia sido ressuscitada na Terra. Na
invasão, Shao Kahn é derrotado novamente por Liu Kang e as forças da Exoterra
retornam para o seu reino. Mortal Kombat III teve ainda duas outras expansões,
Ultimate Mortal Kombat III e Mortal Kombat Trilogy, mas estas não adicionam
elementos estruturais ao enredo.
Esses jogos se referem à fase 2D da franquia, que é aquela que foi relida
a partir da engine. Após essa franquia principal, todos os outros jogos principais
foram feitos ou em 3D ou em 2.5D. Não nos aprofundaremos no enredo destas
produções porque os aspectos estéticos foram reaproveitados em detrimento
das suas sinopses.
No aspecto programacional, ressaltamos que, além dos sprites
digitalizados, o jogo possuía uma outra característica muito marcante:
personagens que tinham, basicamente, o mesmo sprite, mudando apenas os
movimentos especiais e a paleta de cores do personagem. Alguns personagens
que possuem essa característica: os ninjas (Scorpion, Subzero, Reptile) e os
ciber-ninjas (Smoke, Cyrax). Portanto, já desde o próprio começo do jogo existe
uma ressignificação dos sprites.
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Ermac é um desses casos. Ele é um dos ninjas do jogo, e a sua escolha
aconteceu por conta de sua própria origem e pela mudança de sua identidade
visual ao longo dos jogos principais da franquia:
Quando as primeiras versões de arcade de Mortal Kombat haviam sido
lançadas, houve uma listagem nos menus que indicam "ERMACS".
Mais tarde, em outras versões, foram listados em baixo "Reptile
Battles", dando a aparência de que eles formavam grupos. Acreditava-
se que faziam referências a um personagem da mesma maneira que
as "batalhas de Reptile" e isso fez com que as pessoas acreditassem
que Ermac também era um personagem secreto em Mortal Kombat. A
listagem ERMAC é uma abreviatura do termo "Erro de macro"
(ERMAC, s/d).
De início, o personagem era apenas um erro da leitura do personagem
Scorpion, que mudava de paleta e passava a ser vermelho e a barra de energia
aparecia com o nome Ermac (sigla para Error Macro), o que gerou muitos
rumores de um novo personagem. O seu background é de que:
Ermac é uma junção de inúmeras almas mortas em guerras que
assolaram Outworld. Sendo uma concentração absoluta de almas,
Ermac tem o dom da telecinese, além do estranho poder de viajar entre
os diferentes reinos. No entanto, a parte mais "funda" de Netherrealm
tem a capacidade mística de drenar as forças vitais de todas as almas,
que enfraquecem-o drasticamente por lá (ERMAC, s/d).
Por mais que o desenvolvimento do personagem do ponto de vista do
enredo seja interessante, o que é mais relevante é a parte visual dessa
composição. Porque muitos dos referentes partem dessa verdadeira “história
visual” do personagem, que, por característica da franquia, volta (RODRIGUES,
2016). A imagem 1 mostra a primeira aparição:
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Imagem 1: sprite de Ermac no MK1
Fonte: https://www.giantbomb.com/ermac/3005-371/concepts/. Acesso em 04/01/2019
São, basicamente, os sprites do personagem Scorpion, mas com uma
outra paleta de cores. No Ultimate Mortal Kombat 3 (UMK3), o personagem é
oficializado e volta com uma história: ele é um corpo que recebe diferentes
espíritos e que é utilizado para lutar nos torneios Mortal Kombat. O seu design
era o de um ninja, com uma paleta de cores vermelha, tal como pode ser
acompanhado na imagem 2:
Imagem 2: alguns sprites originais de Ermac no UMK3
Fonte: http://www.gfxvoid.com/forums/showthread.php?29169-Make-a-Sprite-Signature-MK-
Style. Acesso em 04/01/2019
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Note-se, é a partir desses sprites que a comunidade do M.U.G.E.N cria
os personagens, modificando-os para expressar suas criações. O personagem
aparece também no game Mortal Kombat Trilogy, mas sem modificações, visto
que este título se trata de uma expansão. Esta é a última versão do personagem
em 2D, e ele ficou de fora da franquia até o ano de 2004.
Quando o ambiente se deslocou para a programação 3D, o personagem
ganhou uma identidade própria. No jogo Mortal Kombat Deception (de 2004, ao
qual chamaremos de MKD), que não utiliza a tecnologia dos sprites, Ermac já
possui uma roupagem própria e olhos brilhantes, tal como é mostra na imagem
3:
Imagem 3: Ermac em Mortal Kombat Deception
Fonte: http://www.game-art-hq.com/mortal-kombat-deception-wallpapers/mortal-kombat-
deception-ermac-wallpaper/ Acesso em 04/01/2019
No jogo Mortal Kombat Unchained (de 2006, ao qual chamaremos de
MKU), o visual é praticamente o mesmo, mudando, talvez, a cruz na máscara.
Isso fica patente na Imagem 4:
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Imagem 4: Ermac em Mortal Kombat Unchained
Fonte: https://www.fightersgeneration.com/characters/ermac.html. Acesso em 04/01/2019
No jogo Mortal Kombat Armageddon (de 2008, o qual chamaremos de
MKA), podemos observar que algumas mudanças mais profundas finalmente
acontecem:
Imagem 5: Ermac em Mortal Kombat Armageddon
Fonte: https://www.fightersgeneration.com/characters/ermac.html Acesso em 04/01/2019
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A máscara se torna menos fechada, os braços aparecem novamente e
o colete se mostra mais parecido com as primeiras versões, mas o cinto se
mantém o mesmo. Aparecem joelheiras e abaixo da cintura duas faixas de tecido
caem.
O jogo Mortal Kombat 2011 (MK2011) se pretendeu como um reboot, um
recomeço para a história da franquia. No entanto, o Ermac de MKA é muito mais
parecido com o de MK do que o do MK2011, como podemos observar na imagem
6:
Imagem 6: Ermac em Mortal Kombat 2011
Fonte: https://www.vg247.com/2015/01/29/mortal-kombat-x-ermac-announced/. Acesso em
04/01/2019
A máscara se fecha novamente, e o cinto do Ermac 3D some. O colete
se fecha novamente, e as mangas retornam. O primeiro colete ressurge como
resquício, perto do pescoço.
A última versão é do game Mortal Kombat X (de 2015, ao qual
chamaremos de MKX). Nela, Ermac tem suas características elevadas ao
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extremo, ele se mostra um ser menos “corporal” e mais “espiritual”, como se
pode ver na figura imagem 7:
Imagem 7: Ermac em Mortal Kombat X
Fonte: http://www.game-art-hq.com/81630/ermac-from-the-mortal-kombat-series-game-art-
cosplays-and-an-overview-about-the-mysterious-ninja/. Acesso em 04/01/2019
Esse conceito conduz a uma espécie de mumificação do personagem:
ele vai se tornando cada vez mais vestido (primeiramente com tecidos
ordenados, e depois com tecidos que retratam a origem em diferentes almas) e
menos humano, além de a luz verde estar presente no modelo como um todo (e
não apenas na execução dos golpes). Vamos observar que a ressignificação do
sprite de UMK3, separando o que é autoral do que é inspirado nos jogos 3D a
partir de uma análise comparativa.
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5 ANÁLISE DA RESSIGNIFICAÇÃO A PARTIR DE SPRITES
O primeiro contato com Ermac, depois de sua seleção, é na chamada
“tela de encarada”. Nela, imagens dos chars ficam frente a frente, enquanto os
arquivos (sprites, cenário e indicadores) são carregados sem o usuário poder
acompanhar esse progresso. O personagem que aparece está na imagem 7:
Imagem 8: arte de “encarada” com máscara de Ermac 3D
Fonte: http://www.trmk.org/forums/showthread.php/26153-Kustom-MK-Kharacters-for-Arcade-
VS-screen/page3?styleid=18. Acesso em 04/01/2019
Podemos observar que se trata, basicamente, do sprite de UMK3, mas
com a máscara de Ermac do Mortal Kombat Unchained (imagem 3). Quando o
jogo é, finalmente, carregado, podemos observar o sprite do personagem, tal
como na imagem 9:
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Imagem 9: sprite de posição de luta
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=dDVUG0ZOmAg. Acesso em 04/01/2019
Excetuando-se a paleta de cores (cuja tonalidade vermelha é mais forte,
por exemplo), podemos observar que se trata do mesmo sprite da figura 3, com
a exceção dos olhos: na imagem 8, os olhos possuem coloração verde, que é a
força espiritual característica do personagem. Tal força não se manifestava no
sprite original, não fosse em movimentos especiais - não aparecia nem mesmo
na pose de vitória e nem nos fatalities. Os desenvolvedores, portanto, trouxeram
esta influência também da imagem 3.
Podemos observar que a ressignificação não se manifesta apenas no
aspecto dos olhos. Ela também trata de uma reconstrução do próprio sprite, e
não apenas uma edição pontual. Como mostra a imagem 10, há uma skin6 feita
para Ermac que remete explicitamente para o referente:
6 Aspecto alternativo possível para um software.
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Imagem 10: skin adaptando modelo 3D
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=KpoyC-rEvuo. Acesso em 04/01/2019
À direita podemos ver Ermac parcialmente com os trajes da imagem 3.
Apenas da cintura para baixo é da imagem 2. Mas essa é uma skin, não é o
sprite mais conhecido. Talvez como resquício desse skin, há uma mudança do
Ermac da imagem 11, como aparece na imagem seguinte:
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Imagem 11: sprite com a máscara do Ermac 3D
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=uR9ZQwuaZ6w . Acesso em 04/01/2019
Essas evidências mostram que, no tocante aos trajes do char
colaborativo, a maior influência é a do Ermac do MKU. Mas na questão dos
movimentos do personagem, vamos observar que a influência é muito maior dos
MK 2011 e MKX. Basicamente, os movimentos do char são ainda os mesmos do
UMK3, mas vamos observar algumas outras autorias.
Da imagem 12 até a imagem 14, podemos observar a sequência de dois
fatalities: M.U.G.E.N e MK2011, sobre os quais teceremos mais detalhes para
mostrar essa inspiração. Na construção fica evidente a conexão desses jogos a
partir dos programadores.
Na imagem 11, podemos perceber que Ermac ergue o adversário (um
movimento do sprite original, mas sem a energia verde concentrada na mão). É
de se notar que o adversário, o char Tanya (que apareceu pela primeira vez no
jogo Mortal Kombat 4) - ela foi criada pela comunidade também com base em
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sprites já existentes, das personagens Kitana e Milenna. De qualquer maneira,
podemos ver:
Imagem 12: Ermac erguendo adversário com força espiritual
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=oZLGWi3RJjM. Acesso em 04/01/2019
Quando apreciamos em MK2011, tal movimento da imagem 12 é muito
parecido com o executado na Imagem 13:
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Imagem 13: Ermac erguendo com energia espiritual em Mortal Kombat 2011
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=GM_CJk2-Oxw. Acesso em 04/01/2019
Podemos notar, já de saída, que a existência de uma modelagem
permite uma mudança de foco na câmera em MK2011, o que não é possível
para jogos com sprite, que podem, no máximo, afastar ou aproximar a câmera.
Também notamos que os desenvolvedores utilizaram um sprite já disponível
anteriormente (o do braço erguido), dando um novo uso para esse contexto. O
adversário também utiliza um sprite de colisão, e que também é diferente do
modelo 3D. Mas o movimento, como pode se observar, é o mesmo. A imagem
14 mostra a sequência da cena:
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Imagem 14: Ermac executando desmembramento
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=oZLGWi3RJjM . Acesso em 04/01/2019
O sprite de Ermac permanece o mesmo, mas o do adversário sofre um
desmembramento. É possível de se ver que se trata do reaproveitamento de
sprites, utilizados em outras situações. Os modelos 3D da imagem 15 mostram
a mesma situação, mas por outro ângulo:
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Imagem 15: Ermac executando desmembramento em Mortal Kombat 2011
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=GM_CJk2-Oxw. Acesso em 04/01/2019
A mudança de câmera não impede que vejamos que se trata do mesmo
movimento. A sequência do fatality é diferente: Ermac MK2011 atira o tronco do
adversário no chão, o que os desenvolvedores não conseguiram literalmente
emular. Na versão de M.U.G.E.N, o tronco simplesmente explode: talvez os
desenvolvedores tenham tentado realizar a cópia perfeita dos acontecimentos,
mas o resultado pode não ter sido satisfatório e a explosão foi a solução
encontrada.
Por não se tratar de um personagem popular na franquia, não
encontramos mais fatalities que emulassem completamente aqueles dos
modelos 3D (o que encontramos em outros personagens mais populares, mas
que não vamos expor aqui). Na imagem 16, podemos observar uma leve
influência na composição da cena:
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Imagem 16: Ermac com cabeça decepada
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=oZLGWi3RJjM. Acesso em 04/01/2019
O fatality, na sua sequência, foi completamente autoral por parte dos
desenvolvedores. Mas o movimento final, o da cabeça do adversário indo parar
na mão de Ermac, encontra seu referente na cena da imagem 17:
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Imagem 17: Ermac com cabeça decepada em Mortal Kombat X
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=GM_CJk2-Oxw. Acesso em 04/01/2019
Os fatalities dos personagens, em essência, são diferentes, mas o final
é o mesmo. Talvez este encerramento seja o único aspecto ao qual os
desenvolvedores conseguiram emular de maneira convincente, pois já existia o
sprite com as mãos espalmadas e só seria preciso colocar a cabeça do outro
personagem naquela região para que se tornasse convincente.
Outro aspecto interessante dessa ressignificação é a pose da vitória. Das
imagens 18 a 19, podemos observar a pose sendo realizada paulatinamente:
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Imagem 18: pose da vitória
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=oZLGWi3RJjM. Acesso em 04/01/2019
As mãos juntas não são originais do personagem. Provavelmente, ou
estas foram unidas com a reorganização das figuras dos braços ou com o
reaproveitamento de um sprite de algum outro ninja. Nos sprites originais do
UMK3 não havia, também, a energia verde. Na imagem 19, podemos ver que
essa energia se transforma em 4 pequenas esferas:
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Imagem 19: pose da vitória
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=oZLGWi3RJjM. Acesso em 04/01/2019
Por fim, o último aspecto que gostaríamos de ressaltar dessa
ressignificação é o da reinterpretação de uma parte do próprio jogo original.
Podemos apreciar, na imagem 19, Ermac executando um movimento de ataque
com um machado:
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Imagem 19: golpe do machado
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=oZLGWi3RJjM. Acesso em 04/01/2019
Este machado não foi feito do zero pelos desenvolvedores do
M.U.G.E.N. Ele foi reaproveitado de outro personagem, como podemos ver na
imagem 20 que, ironicamente, foi o personagem que cedeu o seu sprite para
Ermac no MK1:
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Imagem 20: Scorpion original e seu machado
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=gY__YTNnvoI. Acesso em 04/01/2019
O trabalho de ressignificação foi o de pinçar a figura, mudar a sua paleta
de cores (de cinza para verde) e girá-la. Assim, isso reforça que a ressignificação
considera que o personagem deve ser focado, precisamente, na questão da
energia verde. Talvez isso explique porque o personagem oficial foi sendo
marcado por esse aspecto: possivelmente os desenvolvedores oficiais tenham
se adornado da ideia reforçada pela comunidade de desenvolvedores. E assim
se estabelece uma dialética no qual o próprio jogo oficial é resultado também de
uma ressignificação, mas por uma diferente da de pesquisa de mercado ou da
mera venda de unidades.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este artigo tratou de uma ressignificação, evidenciada através do Mortal
Kombat Project, este desenvolvido a partir do software (que denominamos livre)
M.U.G.E.N. Observamos como a obra original (UMK3) foi relida a partir desses
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desenvolvedores, cujo processo implicou, também, uma releitura a partir do 3D.
Optamos pela análise do personagem Ermac, dado que esse foi fruto de um erro
de programação do primeiro jogo da franquia Mortal Kombat, e que foi
incorporado como personagem pela equipe de produção a partir dos boatos
gerados pelos consumidores.
Notamos que a construção do personagem se trata mais de uma
atividade de edição do que de inovação: os desenvolvedores fazem uma
reorganização dos elementos do jogo original com base em outras influências.
Foi possível notar, também, uma aproximação paulatina dessa
ressignificação com o seu objeto. Esta foi editando o personagem aos poucos, o
que se evidencia pela complexidade das intervenções no sprite original. O sprite
começou a ser editado com mais profundidade a partir de 2004, apreciável pelas
influências de MKU com a adição dos olhos brilhantes apenas. Quase dez anos
depois foi acontecendo um maior número de modificações e a adição de
movimentos mais complexos como o dos fatalities, quando já estava lançado o
MK2011, e essa influência fica patente no material analisado. É claro que a
produção da ressignificação não se trata de uma produção com o mesmo padrão
de um estúdio: seria necessário um polimento muito maior nos artefatos do
M.U.G.E.N para que superassem a obra original, até porque o código se mantém
inalterado. Todavia, essa esfera de inacabado parece ser um incentivo para o
aumento de interações e da execução de ideias nos ambientes propícios.
Cumpre ressaltar que Mortal Kombat é a franquia de jogos de luta mais
modificada pelos desenvolvedores, aparentemente muito mais do que Street
Fighter ou do que King Of Fighters (outras franquias extremamente famosas).
Isto porque existem verdadeiras dinastias de MK em M.U.G.E.N: “Atualmente
existem vários games baseados em MKP, como MK Antology e Chaotic (feito
por Indrid Cold & Haso), MK Bloodstorm (WIP por Bruno and Japa) e uma versão
de MKP do MK 9 feito por Maxi619” (MORTAL, s/d). Encontramos, ainda, um MK
Trilogy X, um MK Quadrilogy e, ainda um MK Defenders Earth Talvez a
explicação para tal fenômeno seja uma espécie de cumplicidade da franquia com
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seu público, o que faz de Mortal Kombat um caso bem específico de interação
com o seu consumidor.
Um último ponto é que Ermac parece refletir um desejo de “pureza” por
parte dos desenvolvedores, que pode ter sido aproveitada pela equipe de
produção. As versões mais recentes do personagem vão mostrando que o
personagem “toca” cada vez menos em seus inimigos, utilizando de sua magia
para atacá-los. O personagem oficial foi tendo essa “energia” ressaltada nas
suas versões posteriores, o que pode ser um indicativo da aprovação do por
parte da base de fãs. Assim, a pesquisa de mercado assume outras
potencialidades que não apenas perguntar, há ação envolvida.
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